Peripécias de Nazareno
- Vó me conta uma historinha?
- Claro minha netinha, mas que tipo historinha você quer que eu conte?
- Eu queria uma história sobre pato!
- “Pato”! Hum... Vamos ver... Há! Já sei! Vou te contar uma história que aconteceu comigo há muito tempo.
Depois de muitos anos morando em São Paulo, seu avô e eu resolvemos nos mudar para Belém, terra natal dele. Quando chegamos aqui, em outubro, bem pela época do Círio, me encantei com a grandiosa e belíssima festa em homenagem à Virgem Santa de Nazaré. Era a festa da fé. Em toda a minha existência, jamais tinha visto festa tão fervorosa quanto essa, na época ouvi um comentário afirmando que se tratava da segunda maior festa religiosa do mundo, perdendo apenas para a procissão de Aparecida do Norte, a padroeira do Brasil, em virtude de seu grande número de fieis.
Seu avô e eu fomos à casa de uns amigos dele que haviam nos convidado para almoçar, foi quando pela primeira vez provei o “Pato no Tucupi”, aquela foi a melhor iguaria que eu havia comido, tinha também uma “Maniçoba”, da qual não me atrevi a comer, pois tinha um aspecto um tanto esquisito. Fiquei tão maravilhada com o “Pato”, que resolvi pedir a receita à anfitriã, a fim de prepará-lo num almoço na semana seguinte em minha nova casa.
Como eu era nova na cidade, dona Maria, que havia me fornecido a receita, fez o obséquio de encomendar o pato. Segundo ela, o pato deveria ser comprado vivo, para ser morto e depenado por quem fosse cozinhá-lo, esse era o costume, portanto achei por bem preservá-lo. Quando o animal chegou à minha casa, fiquei impressionada com aquele “patarrão”. Amarrei-o no quintal e fui até a cozinha iniciar os preparativos do “Prato”, foi quando ouvi um grito:
- Corre que o pato ta fugindo!
Corri até o portão e vi meu pato fugindo ao longo da rua, e pra não perder o “pato” e o “prato”, corri atrás do dito cujo. Mas não é que o danado corria mesmo. Ele subiu a Antônio Barreto, pegou a Alcindo Cacela, e eu na cola dele, estava tão concentrada em querer alcançá-lo que nem me dei conta da multidão que se formava atrás de nós, até que ouvi outro grito:
- Quem pegar o pato leva pra casa!
E o povo crescia atrás do meu pato que a essa altura já tinha chegado à José Malcher e seguia em direção à Avenida Nazaré. Já estava cansada de tanto correr e imaginando se esse pato não ia mais parar. Um garoto que assistia a tudo de longe berrou: - Égua do pato ligeiro! E quanto mais difícil se tornava alcançar o pato, mais gente se empenhava em consegui-lo. Ao chegar à Basílica de Nazaré, o pato parou e entrou na igreja, e a multidão de corredores entrou junto.
Foi a maior confusão, era gente pra todo o lado, correndo, gritando e chamando pelo pato, outros fazendo promessas pro caso de encontrá-lo, enfim, a igreja estava a maior balbúrdia. O padre e o sacristão já estavam perdendo a paciência com todo aquele alvoroço na casa de Deus, até que finalmente eu o encontrei, e num rompante de alegria soltei um urro que fez com que todos se calassem. Tive muita sorte de ter ido procurar aquele pato justo no lugar menos provável, o confessionário. Diante daquela situação constrangedora e embaraçosa, não tive outra saída senão pedir desculpas ao padre e explicar toda a situação, e enquanto eu me explicava, a multidão, agora sentada e em silêncio, ouvia atentamente cada detalha de minha aventura. No final todos riram e ficaram muito impressionados com tudo, principalmente com a destreza daquele pato. O padre aproveitou que a igreja estava cheia e resolveu realizar uma missa.
Ao sair da igreja com o pato nos braços, fui abordada pelo repórter de um jornal local, ele queria que o pato e eu fôssemos ao telejornal dar uma entrevista. No fim de tudo, o pato e eu acabamos virando celebridades e eu acabei ficando sem o “prato”. Como se isso não bastasse lhe deram o nome de Nazareno e ainda escolheram-no para ser a mascote da corrida do Círio, que acontece todos os anos.
- Então? Gostou da historinha?
- Adorei vovó, amanhã eu vou querer ouvir outra! Boa noite!
- Boa noite minha querida, sonhe com os “patos”. Quer dizer, com os anjos!
Texto de: José Fernando Oliveira de Freitas.